Crônicas

Amores maduros

Não me lembro de ao certo o porquê de alguns amigos começarem a falar, durante o almoço no trabalho, sobre a época da escola. Dez anos se passaram, mas parece que foi ontem que sai do ensino médio. Falávamos de paixões, sobre a ingenuidade e de tudo aquilo que o novo causa aos nossos olhos.

Então me lembrei de que naquela época odiava os feriados e os fins de semana, porque eram os dias em que não poderia ver o amor da minha vida — julgava uma paixão avassaladora que lembro até hoje o quanto sofria. Adolescente adora um drama. Os melhores momentos eram o intervalo, quando poderia vê-lo. Quando ele faltava, sentia um vazio que consumia as vísceras.

Ninguém nunca soube o que sentia por aquele rapaz — a não ser ele. Eu nunca verbalizei o sentimento, mas sempre arrumava algum jeito de falar com o deus grego, o que supostamente, penso eu, que foi quando ele entendeu tudo.

 Uma vez fui até onde trabalhava, ia sempre, já que era em um supermercado perto de casa. Foi ali que trocamos algumas palavras. Gaguejando, devia ter falado sobre uma briga na escola ou sobre o quanto as nossas professoras eram rudes. Depois disso toda vez que nos encontrávamos ele piscava para mim. Eu sentia um frio na barriga até que, um dia, ele apareceu de mãos dadas com uma garota da escola. Foi quando aquela expectativa toda caiu por água abaixo.

Contei isso porque uma amiga terminou um relacionamento há pouco tempo e me contou sobre as coisas que fez para que ficassem juntos até o último instante. Eu não disse a ela o quanto ficamos bobos quando estamos apaixonados, mas não me contive ao dizer o quanto as paixões nos levam de volta a adolescência.

Se por um lado vir àquela solidão toda que estava sentindo era indigesto, por outro eu ficava feliz. Fiquei feliz porque se permitiu viver uma história, embora um final nada feliz, em que ambos não são mais um estranho para o outro. 

São poucos aqueles que dão lugar para viver uma história que não se sabe até quando. Relacionamentos são complicados porque é natural que a cereja do bolo perca a graça à medida que se consome. É preciso muito diálogo para superar as surpresas, quando as inseguranças surgem de modo que o silêncio tome conta quando tudo está muito calmo. É preciso muita sabedoria para regar as plantas, para que as palavras não se tornem munições.

Voltamos à adolescência, porque é de lá que fomos feitos. Os dramas que nos consomem vêm do bebê bem tratado que fomos, mas que ainda, sim, em algum momento, faltou afeto e que resultou em insegurança. Nem é preciso dizer quando se pisam em feridas que reabrem a ponto de perdemos o fôlego. Mas pareciam fechadas?

Pois é, basta um beliscão para que os sintomas retomem. A boa notícia é que de experiência em experiência que se pode alcançar um amor maduro.

Quanto ao rapaz da escola? Soube que tem um filho e ficou noivo. Vimo-nos há dois anos. Senti um frio na barriga, mas graças à terapia, soube que não eram estrelinhas nos céu, mas, sim, vergonha.

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Leandro Salgentelli nasceu em Jundiaí (SP), em 25 de setembro de 1994. É jornalista e especialista em Cultura Material e Consumo pela USP. Foi vencedor de dois prêmios nos gêneros crônicas. Atualmente, trabalha com assessoria de Relações Públicas Instituicionais.

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